Luiz-Olyntho Telles da Silva Psicanalista

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POBRE DE MIM

Luiz-Olyntho Telles da Silva

22.03.2007


No domingo, em ZH, (18/3/2007) Franklin Cunha indagou por Nossos sobrinhos das ruas. Uma pertinente perquirição sobre os pobres e os ricos. Depois ouvi de um jornalista que se Bush investisse os quatrocentos bilhões da guerra do Iraque em benfeitorias, criaria um paraíso. E então, juntando tudo isso a uma ironia de um colega sobre Bush (Quem nasceu para Bush, nunca chegará a ser uma grande árvore), pensei na pobreza de nossa inteligência.

Lembrei logo de uma passagem do Ulisses, de James Joyce: Nestor. Ah! Se os Bush o conhecessem... Ele aparece na Odisséia como rei de Pilos e recebe Telêmaco, o filho de Ulisses, afetuosamente. Mas o tratamento dado a Telêmaco não é um privilégio. Nestor é assim, um rei idoso e indulgente; apoiado nas reminiscências dá um dente por uma prosa. Nas querelas entre os chefes gregos, sublinha-se, recomenda sempre moderação.

E sob a égide desse Nestor, apoiado em um chiste recolhido do folclore irlandês, Joyce joga para cima - sirva o chapéu a quem servir - através de Stephen, o seguinte enigma: The cock crew / The sky was blue: / The bells in heaven / Were striking eleven. / Tis time for this poor soul / To go to heaven.

A resposta o próprio Stephen, a garganta comichosa, oferece: The fox burying his grand-mother under the hollybush.

The fox? A da fábula A raposa e as uvas? Não! The Fox and the Bush! A justificativa está na referência à Circe, onde o próprio Stephen desdobra o enigma: The fox crew, / the cocks flew, / … / To get out of heaven. Quer dizer, quem esconde a história, quem esconde a grand-mother sob o arbusto, é a raposa, cucuricante qual um galo voador. O céu já não é seu lugar! – Get out!

O paraíso do jornalista não passa de um recurso de linguagem! Voltar ao paraíso, sem a ciência do bem e do mal, seria o caos! Seu ideal há de ser aquele de uma vida melhor para todos. E que dizer da ironia cruel de Saramago?  - Queira Deus que nunca se extinga a caridade para que não venha a acabar-se a pobreza.

Saramago aponta para lugares epistemológicos necessários. Claro, uma coisa se define através daquilo da qual se exclui! A diferença é fundamento da cultura. Mas daí a defender a pobreza? A dos nossos sobrinhos? Não posso crer fosse essa a idéia de Saramago! Vejo aí a presença da pobre inteligência, fenômeno tão importante quanto desconhecido, e incapaz de encontrar uma alternativa ao mal.

Sabemos que o mal - enquanto pulsão agressiva -, é necessário, sem ele talvez a criança não reconhecesse o mundo. Mas será preciso incrementá-lo cada vez mais? Será a super-riqueza econômica uma maneira de compensar nossa pobreza intelectual? Continuo considerando, pobre de mim, a raposa símbolo da esperteza? Mas the fox, não esqueçamos, quando não consegue alcançar o que quer, destrói o objeto do seu desejo.



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