Luiz-Olyntho Telles da Silva Psicanalista

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ANUNCIAÇÃO
III
A MESSIAS

Luiz-Olyntho Telles da Silva
03 de agosto de 2012

Locutus est autem Deus ad Noe dicens: egredere de arca tu et uxor tua filii tui et uxores filiorum tuorum tecum.
(GENESIS, 8:15-16l)






    Outro dia fiquei me perguntando por que os descendentes de Sem, filho de Noé, resistiam em reconhecer no nascimento de Jesus o Messias. E encontrei aí uma verdade: se ele ainda não nasceu, devemos ficar atentos a cada nascimento de um novo ser!
    Mas o que é mesmo que se deve observar? Milagres? Atos grandiosos? Se fosse isso, teria havido ato mais grandioso do que o de Noé, dando a todos uma nova chance de vida? Quando Moisés salva o povo eleito da escravidão, no Egito, pode-se dizer que não houve grandiosidade? E da sabedoria de Jesus, não se pode dizer grandiosa? A resposta óbvia é sim, para todos. Fossem gregos, diríamos sim, para todos os heróis. É claro que todos esses atos foram grandiosos, mas é verdade, também, que em cada um houve tropeços. Noé, depois da quarentena, fascinado com sua invenção, o vinho (talvez o ato mais grandioso de todos), embriagou-se e deixou-se ver desnudo pelos filhos. Uma cena de verdadeiro horror, pois, nos primeiros tempos, não havia maior opróbrio do que ser visto nu. Moisés teria demorado muito tempo para atravessar o deserto e chegar à Terra prometida. Ernest Sellin diz até que, nesse entrementes, o personagem que representava Moisés foi substituído. Seja como for, sem dúvida um grande feito. E, depois, quantos milagres! Não bastassem as pragas no Egito, suas mágicas que transformavam um cajado em sibilante víbora, ainda foi capaz, conforme o Rabino Meir Matzliah Melamed, de escrever os últimos versos do Deuteronômio, mesmo depois de morto. E os milagres de Cristo? Ressuscitar mortos, multiplicar pão e vinho, curar desenganados, e tantos outros! Não. Não deve ser por aí! Para alguém ser reconhecido como Messias, talvez seja preciso algo bem menos pomposo. Está bem que seja algo da ordem do milagre, mas bem mais simples.
    Foi então – passada a quarentena –, que comecei a olhar para minha recém-nascida netinha. Foi algo assim como o ocorrido entre Miguelina e sua netinha Francisca, no romance Atado de Ervas, da Ana Mariano: ao ver pela primeira vez a luz do dia, a bruxa já sabia quem ela iria ser! Diferente, porém, de Miguelina, não vi o que ela seria, nem o que faria no futuro; vi, antes, o que havia feito no momento mesmo de nascer: como que por encanto, no instante em que ela viu a luz, minha filha metamorfoseou-se em mãe, sua mãe transformou-se em vovó, meu genro, em pai, meus outros filhos em tios, e eu, ainda que um pouco tonto, tal um novo Noé, virei avô.