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15 I 2010:
TSURU
Luiz-Olyntho
Telles da Silva
Terminei o ano com a arte japonesa.
Pois comecemos o ano também com ela. Inspira-me um sentimento de organização,
sempre tão necessária nessa época de planejamento das novas atividades;
parece envolver uma sabedoria tão milenar que algo da verdade deve conter.
E isso não só na sua poesia.
No começo do mês de janeiro ainda recebemos votos de saúde, alegria
e prosperidade. Alguns amigos, demasiadamente ocupados nos últimos dias
do ano que passou, fazem assim. O primeiro mês do nosso calendário recebeu
seu nome em homenagem a Jano justamente por isso. Sendo um deus bifronte,
ele olha para frente, mas também para trás! E, por vezes, também para os
lados.
Não satisfeito com essa clara e permitida justificativa, um amigo, bem
humorado, justificou seu retardo contando-me que gastara um enorme tempo
à procura de uma maneira de formular os votos para que eles efetivamente
se realizassem, e que estava já muito perto dessa descoberta; porém, como
não tinha resolvido completamente este enigma, demorara. Gestos como esse,
eu os incluo na categoria dos beaux gestes. São os amigos que nos
têm junto ao coração com uma boa lembrança, sentimentos sempre recíprocos.
Em um primeiro momento, tomado pelo mesmo espírito, brinquei com ele,
dizendo-lhe de minha surpresa: como, justamente ele, um descendente do
Rabino Yehuda Loevy, O Maharal de Praga, criador de um Golem capaz
de obedecer a todas as ordens, não conseguia fazer algo assim tão simples?!
Mas logo me dei conta de haver aí algo mais sério.
A realização dos desejos é um tema de sempre! Quem não lembra histórias
envolvendo a fonte dos desejos? O Eldorado pelo qual tantos deram a vida?
Nós os incluímos nos votos para as pessoas queridas porque representa sempre
um carinho, uma atenção. É assim por todos os lados.
Os psicanalistas vêem no sonho uma forma de realização de desejo, ainda
que alucinatória. Mas existe no Japão uma lenda que ensina a formular um
desejo de modo a que ele se realize mesmo, de verdade! Está ligada à arte
dos origamis e à ave que a representa, o Tsuru.
Na cultura japonesa, dizem que o Tsuru – conhecido por nós como
Grou, esse pernalta cultrirrostro e de amplas asas –, vive
mil anos. Companheiro dos místicos, o Tsuru passou a representar
juventude e longevidade. Em suas asas pode carregar a alma dos mortos para
o outro mundo e, para nós, como herança da cultura européia, é a cegonha
que pode trazer os nenês. O Tsuru convive com inúmeras gerações,
desde muito, tendo sido inclusive um alimento fácil em toda a Ásia, por centenas
de anos. Na arte origami, sua dobradura constitui-se no esquema básico para
a construção de inúmeras outras figuras, o que por certo contribui para
sua difusão e conhecimento. E então a lenda: aquele que construir mil origamis
de Tsuru, expressando seu desejo a cada dobradura, quando completar
o sembazuru (mil Tsurus), vê-lo-á realizado!
Quê estamos esperando? Mãos à obra!
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