Abertura
Biografia
Publicações
Traduções
Textos:
- Psicanalíticos
- Crítica
- Contos
- + recente
Fortuna crítica
Comentários
Atividades
Links
Contato
|
A SENHORA
SELVAGEM
Berenice Sica Lamas
Porto Alegre, Evangraf, 2011, 64p.
À Senhora selvagem,
Ama, com fé e orgulho, a terra em que nasceste!
Criança!
Não verás nenhum país como este!
Olha que
céu! Que mar! Que rios! Que floresta!
A Natureza,
aqui perpetuamente em festa,
É um seio
de mãe a transbordar carinhos.
Vê que a
vida há no chão! Vê que vida há nos ninhos,
Que se balançam
no ar, entre os ramos inquietos!
Vê que luz,
que calor, que multidão de insetos!
Vê que grande
extensão de matas, onde impera
Fecunda e
luminosa, a eterna primavera!
Boa terra!
Jamais negou a quem trabalha
O pão que
mata a fomeÀ, o teto que agasalha...
Quem com
o seu suor a fecunda e umedece,
Vê pago o
seu esforço, e é feliz, e enriquece.
Criança!
Não verás nenhum país como este!
Imita na
grandeza a terra em que nasceste!
OLAVO BILAC, Soneto à Pátria.
Um livro de poemas? De prosa? Autobiografia? Talvez uma história do mundo,
uma parte da história do mundo, do ottocento aos nossos dias. A
senhora selvagem é um pouco como ver o retrato lírico de nossos avós,
ainda em preto e branco, passando pelo sépia, ganhando cores e começando
a quebrar as formas, decompondo-se, como em quadro de Braque, talvez, para
melhor nos deixar ver o que a forma fechada fecha.
Há um movimento, anterior, de ida, e um novo movimento, com as cores do nostos
grego, mas sempre ida. Uma repetição sempre diferente. De Bolonha ao santo
canal de São Gonçalo e volta, mas pelas Canárias, por Lanzarote, a mais oriental
de suas ilhas, onde viveu seus últimos anos José Saramago, por Veneza, inspiradora
do bardo, o Lido, o Gran Canale, onde me perdi, as pedras, cabralinas,
as vinhas, da ira, mas também da vida. Aportar a si mesmo é uma viagem-de-[v]ida,
ida ao conhecido desconhecido, ida ao norte, despedida a tarde finda às cinco,
para Lorca, mas ainda em direção ao azul do cobalto para começar, pontualmente,
às cinco, fino all’alba, para mais uma volta. Os plácidos flamboyants
da praça, a memória longínqua das guerras, o Presidente Júlio de Castilhos
dando-se ao luxo de bisbilhotar o footing. Quando eu pensaria uma
coisa dessas?! A escansão do porto perturbado fascina, conturba!
O poeta navega às margens do futuro desfazendo as matas ciliares. Nel
mezzo del cammin de nostra vita desperta um novo olhar. A decifração
dos conflitos exige a alegoria. A dor faz entender na fome o nome. É preciso
chegar ao inferno de si mesmo, custe o que custar! A senhora selvagem, Lilith,
feiticeira da noite, fada do sol, vai sempre até o fundo. Sendo todas, é
única. E o método da escrita, pronto para todos, possibilita a cada um, na
investigação das inquietudes, o encontro de um estilo, permitindo ao belo
vicejar em campo aberto.
Um encontro feliz das alucinações e dos sonhos nos fungos. Freud encontrou
aí um lugar comum: os sonhos nascem, do mesmo modo que os cogumelos, de seu
micélio, da multidão de raízes necessárias para conformar tanto uns quanto
outros. Afinal, como dizia Shakespeare, somos feitos da mesma consistência
dos sonhos.
Agora, minh’alma tem sede.
|
Braque - Paciência
escreva aqui seu comentário
|