Luiz-Olyntho Telles da Silva Psicanalista

 




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A AURORA PRECURSORA[1]






Luiz-Olyntho Telles da Silva
68ª Feira do Livro de Porto Alegre
Novembro de 2022.

Liberdade busca, tão cara, como sabe

Quem por ela a vida recusa.[2]

(DANTE, Purgatório, 1:71-2.)

 

Em meados do século passado, nascia, em Porto Alegre, da cabeça dos intelectuais, a nossa Feira do Livro. Hoje ela é uma herança da qual participamos todos os escritores, os livreiros, os leitores, todos os frequentadores dos caminhos demarcados pelas barracas das livrarias, à sombra do jacarandás da Praça da Alfândega. Aí instalada, aí ficou e vem crescendo.

Nos seus primeiros 10 anos, de 1955 a 1965, não se pensou em homenagear ninguém. A preocupação era tornar nossa literatura mais conhecida do grande público. Essa ideia, da homenagem, surgiu ao final dessa década e, na 11ª, tivemos o primeiro homenageado: Alcides Maya, advogado, deputado, cronista e escritor de Ruínas Vivas, Tapera e Alma Bárbara, obras nas quais descreve os costumes e a violência de nossa campanha, onde o homem do campo tornou-se um bandido porque não pode ser um trabalhador.[3] Membro da Academia Brasileira de Letras, foi, e continua sendo, um nome a engrandecer nossas letras. Com Alcides Maya, falecido em 1944, iniciou-se uma série de homenagens póstumas, as quais incluíram, entre outros, João Simões Lopes Neto (12ª), Luís Vaz de Camões (18ª), Erico Verissimo (22ª), Auguste Saint-Hilaire (25ª) e Monteiro Lobato que, junto com Reynaldo Moura, foram os Patronos da 28ª Feira do Livro de Porto Alegre, no ano de 1982.

O primeiro Patrono homenageado em vida foi o editor Mauricio Rosenblatt, um de seus fundadores na 30ª Feira, em 1984. A partir dessa data, em todas as edições da Feira do Livro, um Patrono tem sido homenageado e tem aberto a feira com um discurso. Entre os grandes nomes que se seguiram estão Mario Quintana (31ª), Moacyr Scliar (33ª), Guilhermino César (36ª), Carlos Reverbel (39ª), Lya Luft (42ª), Luiz Antônio de Assis Brasil (43ª), Armindo Trevisan (47ª), Donaldo Schüler (50ª) e a poeta Maria Carpi (64ª), entre outros distintos intelectuais gaúchos. Na última, a 68ª Feira do Livro, a homenagem foi dedicada ao poeta, Membro da Academia Brasileira de Letras, Carlos Nejar, reconhecido e premiado internacionalmente, autor de inúmeros títulos, dentre os quais destaco Os invisíveis (Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1919, 364p.), subtitulado Tragédias Brasileiras, no qual canta a pobreza e a tristeza de nossa gente. Ele, que já fora homenageado na 46ª Feira do Livro, quando o Patrono foi Barbosa Lessa, nesta recebeu o patronado de seu filho, Fabrício Carpi Nejar, Patrono da Feira anterior. Em seu discurso de abertura, falando da pujança da literatura dos gaúchos, desejou-lhes dias feitos só de auroras, sem crepúsculos.

Esse poeta – o gaúcho Carlos Nejar –, com o pampa sempre no peito, onde fica nos arrozais com seu texto de água irrigada, com os cavalos sibilantes sobre o prado, não descura o papel das coxilhas, caracteristicamente sulinas, ao facear nosso fim, pois se a morte é sozinha, o pampa sabe sempre, com presteza, o que ela sente![4]

Ao desejar renovadas auroras verdejantes à literatura dos gaúchos, Nejar – que, fazendo jus ao seu nome, em cuja raiz árabe se lê um marceneiro, se tornou um exímio artífice da poesia –, assim, desejante, o faz inspirado nos versos de Francisco Pinto da Fontoura (conhecido pelos íntimos como Chiquinho da Vovó), o autor do nosso hino, o qual canta, gloriosamente assim:

Como a aurora precursora

do farol da divindade

foi o vinte de setembro

o precursor da liberdade.

Mas não só! Também o faz, sobretudo, estremado em seu imenso Paiol de Auroras,[5] como bem poderia ser chamado o todo de sua poesia.

 



[1] Homenagem à 68ª Feira do Livro de Porto Alegre e ao seu Patrono, Carlos Nejar.

[2] Libertá va cercando, ch’è si cara / como sa chi per lei vita rifiuta. – Trad. do autor.

[3] ALCIDES MAYA. Literatura Nacional. In LÉA MASINA. Alcides Maya. 2ª ed. Porto Alegre: IEL, 1990, p.21.

[4] Excerto do poema de Carlos Nejar, O Pampa e Eu.

[5] Título de um dos poemas de Carlos Nejar.