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Discurso à
Escola Freudiana de Montevidéu,
no seu 30º aniversário.
Luiz-Olyntho Telles da Silva
Outubro de 2012
Ilustríssima Senhora Silvia Buonomo,
M.D. Presidente da EFM
Colegas e amigos da Mesa
Estimados colegas da Escola Freudiana
de Montevidéu;
Senhoras e Senhores.
Quero começar dizendo de minha felicidade em compartilhar este auspicioso
momento junto a amigos e colegas tão queridos.
Como diz Jorge Luis Borges, no seu Poema para los amigos,
Tus alegrías, tus triunfos y tus
éxitos no son míos.
Pero disfruto
sinceramente cuando te veo feliz.
Se nossa relação, que quase cobre os
trinta anos dessa Escola, começou com encontros, nos congressos realizados
em Buenos Aires, em torno às recém-chegadas ideias de Jacques Lacan, nossa
intimidade foi aberta pelo projeto Reunião Lacanoamericana, logo do
encontro com o mestre, em Caracas, no ano de 1980, e mais exatamente nos
encontros preparatórios para nossa primeira Reunião, quase dois anos antes
de Punta del Este, em 1986.
O significante cunhado por Lacan, dizendo
da importância transferencial da letra, havia nos marcado profundamente.
Os primeiros encontros, aqui em Montevidéu,
foram em um bar, e não tiveram o melhor dos resultados. Alguns brasileiros
que vieram comigo nunca mais voltaram. Foi uma lástima! Mas nós estamos acostumados
às refregas, nossos antepassados terçaram armas! Aprendemos daí o valor
mútuo e, os que prosseguimos, estreitamos nossos laços.
Dios mio! Quantos colegas haveria
que lembrar! Entre os que permanecem, quero mencionar Alba Medina, com quem
sempre encontramos assunto para levar adiante nossas preocupações e desfrutar
de leituras comuns. Ela me possibilitou que Carlos Maria Domínguez lesse
minha crítica a um de seus romances. E Beatriz Duró, que se deu ao trabalho
de traduzir e transformar um conto meu em caso clínico, posteriormente discutido
pelos membros da Escola. Que dizer de sua generosidade? Nosso carinho, hoje,
estende-se a Nelson, seu marido, às suas filhas e a seus netos. Minha mãe
tinha por ela grande admiração. Beatriz propiciou-me conhecer a poeta brasileira
Ana Cristina Cesar, quando examinou sua obra em um seminário que ditou para
nós no ano de 2008. Com Alba, Beatriz e Glória estivemos a caminhar pelas
ruas de Bahía Blanca, e tomamos um chá em frente a uma estátua de Garibaldi.
E como a tarde já caía, também fizemos um brinde com um whisky que nos caiu
muito bem. Em Brasília, fomos conhecer a Catedral de Nossa Senhora Aparecida,
projetada por Niemeyer, guardada pelo mamalujo, como diria Joyce,
e aí, junto com Ricardo Landeira, as crianças que ainda somos, raiando de
felicidade, nos extasiamos e desfrutamos de sua acústica!
Afinal, o valor da escuta é hoje, para
nós, quase um outro schiboleth.1
Que Freud escutasse, hoje nos parece óbvio, mas quando Ernst Jones se surpreendeu
com este fato, isso era uma novidade. E recém passaram cem anos! O Mestre
já não auscultava pulmões e outros latidos, escutava a linguagem dos analisantes,
antevendo em cada um a enunciação de uma alíngua! Nesse propósito, Ricardo
Landeira disse uma vez que não importa muito o número dos que vem assistir
a uma conferência; importa o número dos que escutam!
Quando visitamos os amigos uruguaios
em suas Jornadas, é para escutar a Psicanálise que eles escutam. Eis nossa
afinidade. Sabemos que cada discurso é diferente do outro, e que cada escuta
também o é! O destaque de uma palavrinha, uma pequena torção no sentido,
mesmo em um curto som, pode abrir nossa percepção para todo um outro mundo.
Quando descobrimos algo assim, temos a obrigação ética de compartilhar com
nossa comunidade.
E não bastassem suas Jornadas e conferências,
os uruguaios ainda organizaram três lacanos! Por tudo que tem feito pela
Psicanálise, somos nós que devemos homenageá-los!
Uma das marcas dos encontros aqui organizados
é o clima de confiança desfrutado por todos. Quando Alvaro Albacete esteve
presidente da Escola, por exemplo, contrataram um mágico para a festa das
Jornadas, criando um clima muito agradável. Sabemos que é nesse clima que
se cria e prolifera a amizade. Particularmente, esse sentimento grassou em
mim, provocando marcas indeléveis em minha vida. Foi nas Jornadas do Hotel
Oceania, há mais de vinte anos, que conheci minha esposa! Aí, partindo de
Simpatia, nossa relação cruzou muito rapidamente o Mapa do
terno, como diria Mademoiselle d’Escudery, até Verdadeiro Amor.
Noutras Jornadas, fomos hóspedes dos
Ratin, um modo carinhoso de nos dirigir-mos tanto à Célia como ao Enrique!
Poderia contar-lhes das tantas vezes que estiveram conosco, no Brasil, e
também da alegria mútua por um casual encontro no Chile, quando brindamos
com um champã não muito frio! Mas prefiro contar-lhes da oportunidade que
Henrique me proporcionou ao convidar-me para assistir a uma apresentação de
caso. Já não lembro bem dos detalhes - tratava-se de um jovem que se internara
por sérias dificuldades em suas relações afetivas -, mas lembro que seus problemas
apareciam condensados em um plástico de cor amarillo. Não fosse o
clima de confiança - de teor transferencial -, provavelmente eu não teria
escutado aí amar hijo, o ponto crucial de sua história. Antes disso
houvera a jornada de 94. Participava de uma mesa com Ana Solkowski, José
Luis Invernizzi, e o escritor Napoleón Baccino Ponce de León, que há pouco
havia recebido o prêmio Casa de las Américas, e Enrique me fez acreditar
que minhas associações não eram meras pavadas! Ainda lhe sou grato
pela espontaneidade! E seu pulso firme, quando se trata de tomar decisões
organizativas, sempre dá muita segurança aos que lhe acompanham.
Em Ricardo Landeira tenho encontrado
um colega com todas as letras e um crítico rigoroso. Nos últimos anos, com
generosa regularidade, tem estado conosco em Porto Alegre, mantendo-nos atualizados
com seus seminários. Nossa relação, assim como com outros colegas, também
avançou bastante no Mapa do Terno. Nos tornamos amigos. Sua mulher,
Olga, é hoje uma amiga querida também. E Gabriel, filho deles, é alguem
de quem nos orgulhamos como se nosso filho fosse. Em uma das vezes em que
fomos seus hóspedes, nos levaram para assistir a um por de sol em
Punta Ballena! O que sempre me impressionou no Landeira, ao lado
de sua poesia e de seu bom humor, foi sua excelente memória e objetividade.
Quando se trata de ir ao cerne de um assunto, é com ele. Lembro de uma Lacano
em que um colega apresentou um lindo trabalho sobre a obra de James Joyce,
um trabalho que por certo teria feito muito sucesso em uma Jornada especializada,2
mas em uma reunião psicanalítica, o foco do trabalho parecia um pouco deslocado.
Angustiado com o silêncio gerado pela apresentação, seu autor começou a
incentivar a platéia, perguntando: — Por que o silêncio? Aqui tem tantos
joycistas! E Landeira rapidamente acrescentou: — E psicanalistas também!
É pela conjunção dessas vivências que
a EFM passou a figurar, para nós, entre os nomes-do-pai, um dos valores
comuns entre os seguidores de Lacan, e ao qual somos sempre reconhecidos.
E, por falar em nome-do-pai, quero contar-lhes também duas lembranças sobre
os convidados bonairenses dessa mesa, também queridos amigos: José Zuberman,
impactado, em sua juventude, com Neruda,3
atravessou os Andes para conhecê-lo pessoalmente, dizendo com isso de seu
valor ao outro; e Isidoro, uma vez que almoçou conosco em Porto Alegre,
em um restaurante que se chamava Il Padrino, nos contou de um personagem
muito querido na Argentina e que se chamava justamente El Padrino.4
Até aí, uma simples coincidência, mas o inacreditável é que o nome próprio
desse personagem, que, aliás, não costuma ser pronunciado, não era outro
que - vejam só!.. -, Isidoro. Isidoro Cañones. Conto-lhes
essas anedotas para dizer-lhes tanto de minha simpatia com meus colegas,
entre os quais me orgulho de aparecer, como de nossa sensibilidade para
reconhecer a presença de significantes.
E agora, para terminar, quero dizer-lhes
obrigado por tudo! E pedir-lhes que aceitem, no transcurso desses trinta
anos, em meu nome, e também em nome da Biblioteca Sigmund Freud, de Porto
Alegre, nossos melhores votos de felicidade e de muitos anos de vida.
Notas:
1. Três ensaios sobre a sexualidade.
2. Como a Jornada James Joyce, promovida pela Universidade de
Buenos Aires, há alguns anos atrás, na qual tive o privilégio de participar
junto com Isidoro Vegh; enquanto Isidoro fez a palestra de abertura, eu fiz
a de encerramento.
3. Ricardo Eliécer Neftalí Reyes Basoalto
4. Criado em 1935, por Dante Quiterno. Padrinho do irrepreensível índio
Patoruzú
Poema para los amigos (Jorge Luis Borges)
No puedo darte soluciones para todos tus problemas en la vida,
no tengo respuesta para tus dudas o temores.
Pero puedo escucharte y compartirlos contigo.
No puedo evitar que tropieces.
Solamente puedo ofrecerte mi mano para que te sujetes y no caigas.
Tus alegrías, tus triunfos y tus éxitos no son míos.
Pero disfruto sinceramente cuando te veo feliz.
No juzgo las decisiones que tomas en la vida.
Me limito apoyarte, estimularte y ayudarte si me lo pides.
No puedo trazarte limites dentro de los cuales debes actuar,
pero si te ofrezco el espacio necesario para crecer.
No puedo evitar tus sufrimientos cuando alguna pena te parte el corazón,
pero puedo llorar contigo y recoger los pedazos para armarlo de nuevo.
No puedo decirte quien eres ni quien deberías ser.
Solamente puedo quererte como eres y ser tu amigo.
En estos días pensé en mis amigos y amigas,
y entre ellos apareciste tú.
No estabas arriba ni abajo ni en medio.
No encabezabas ni concluías la lista.
No eras el numero uno ni el numero final.
Y tampoco tengo la pretensión de ser el primero,
el segundo o el tercero de tu lista.
Basta que me quieras como amigo.
Gracias por serlo.
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No aniversário de 30 anos da Escola
Freudiana de Montevidéu, os colegas uruguaios homenagearam alguns de seus
inúmeros amigos. Ter sido um dos homenageados encheu-me de orgulho.
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