LEITURAS
UMA CRÍTICA DESDE A ESTÉTICA DA RECEPÇÃO
DULCINEA SANTOS
Que tipo de leitor vamos encontrar nesse texto da Literatura, numa perspectiva
da estética da recepção? O leitor ideal
(um moderno leitor implícito barthesiano) que, numa segunda leitura,
conhecendo a tradição literária e histórica
- e esta é uma terceira leitura -, tem, retrospectivamente,
como primeira, a leitura colhida pela percepção
estética, assim provocando um efeito do texto? Ou o leitor
ingênuo que o assimila espontaneamente? Ou, ainda, o leitor
barthesiano, que, com uma visada na significância – análise
textual da “signifiance” -, deixa em aberto o texto para os possíveis
e infinitos e conjecturais sentidos pelos quais outros leitores - implícitos
- são convidados, nesse processo hermenêutico, também
a desvendá-los?
Luiz da Costa Lima, no seu Teoria da Literatura em suas Fontes (vol.
2), afirma que o processo hermenêutico exige aquela unidade triádica
nos horizontes das leituras. Orientados por essa estética, leiamos,
e também como leitores implícitos, o Luiz-Olyntho
Telles da Silva, examinando como é que ele trata o objeto de
seu Leituras - os textos dos outros autores por ele zelosamente
escolhidos -, e se atende a esse critério.
Logo no início de sua Introdução ao Leituras,
Luiz-Olyntho Telles da Silva faz uma abordagem no horizonte da
estética da recepção. Ele começa
(convocado no seu métier de psicanalista) lembrando que Jacques
Lacan fizera um pedido à história: ser reconhecido como
leitor de Freud (p.12). Assim comenta Luiz-Olyntho: a cada
vez que nos defrontamos com um fato novo, uma idéia nova, isso nos
possibilita rever todas as teorias que tínhamos sobre o mundo e a
vida (p.12) - posição de leitor no horizonte de uma terceira
leitura, a histórica. Faz aí uma ressalva, desta
vez trazendo uma questão pertinente à signifiance:
o pressuposto é que esses textos produzidos sobre outros textos
possam introduzir um afastamento, uma distância crítica entre
o texto e o leitor. Essa hiância, para a qual chama atenção,
causada por esse achado – os textos produzidos -, será
renovada, pois, quando esse achado, digamos, a surpresa
encontrada, se apresenta, é, como diz Lacan, em Os quatro
conceitos da Psicanálise: um reachado, e sempre está
prestes a escapar de novo, instaurando a dimensão da perda (p.30),
e por aí é que assim vai coleando a cadeia...
Luiz-Olyntho - também um leitor drummondiano, sim, claro,
pois José não amou Maria que amou Pedro que amou...? -, deste
modo, ilustra essa circularidade: Esse parece ser o desafio de Pierre
Menard: encontrar no antigo algo novo, assim como Cervantes encontrou antes
algo novo no Orlando Furioso, de Ludovico Ariosto, que provavelmente encontrou
algo novo no Hercules Furens, de Sêneca. É assim que Pierre
Menard/Borges se inclui na cadeia, produzindo mais um passo.
Leiamos Leituras então. Um texto da modernidade. Aqui
vai a mostra de uma análise do primeiro texto de nosso Autor, realizada
nesses horizontes da estética da recepção.
QUAR
TETT
A superação
de Problemas Técnicos
Nesse texto, Luiz-Olyntho aborda o significado do título:
QUAR TETT que, diferente da grafia alemã, como observa, vem graficamente
separado, buscando decodificar o significado. Veremos que a posição
que aí ocupa como leitor não é a daquele que responde
ao signo arbitrário: O que o texto quis dizer? Mas sim a do
leitor avisado, que se indaga: O que me diz o título, ou o
que digo desse título? Questão da hermenêutica literária,
não da historicista, esta, via de mão única,
de significado unívoco.
Luiz-Olyntho começa discorrendo sobre uma ida sua ao
teatro para assistir a Gerald Thomas. Henry Müller, escreve,
transporta Chordelos de Laclos para a Grécia clássica
e revive os primórdios da tragédia. A questão que
aí destaca é a da agonia – e entendamo-la etimologicamente:
do agon grego, embate, conflito, luta -, perguntando se é
o mesmo Eros que a provoca, o que a sofre, daí resvalando para
uma leitura histórica, com o cuidado de evitar que o texto
originário passe por um crivo ingênuo, ao adaptar-se, inadequadamente,
a significados hodiernos, sendo confirmado isso, por exemplo, na sua preocupação
de suscitar conjecturas, levantar suposições, abrindo sentidos,
questionando, como, por exemplo, quando, em determinado momento, se pergunta:
- ironia do autor? E, vagando no horizonte da percepção
estética, ao observar a disposição gráfica
do título - QUAR TETT -, aí, depois de rastrear o radical da
palavra – QUAR -, evocando a polissemia, os diversos sentidos colhidos em
cadeia associativa – quarentena, quarz'halig, Quaraci,
Quarup –, o Autor tece o nostós rumo à Grécia,
onde o efeito resulta no rio correndo para o Mar, fechando-se na circularidade:
Trágico debate que devolve o homem à solidão,
mas não sem antes passar pelo ciúme, este terceiro excluído
de quem se fala, trágico representante do sofocliano tetragonista
(p.21) Mas... FECHADO? pergunta, finalizando sua escrita – un
coup de maìtre -, vetorizando o horizonte moderno da OBRA
ABERTA, pois aí ainda tece: Devolvido à Grécia, podemos
pensar que continua daí, através do Darley de Durrel, seu périplo
para a Alexandria, onde se encenará outra vez o alexandrino drama
da paixão (p.21).
A leitura olynthiana, que inicia com o QUAR TETT de Thomas,
fazendo o retorno ao QUARTETT do Édipo trágico, em circunvolução
chega à trágica agonia da carne - de volta às
origens. Tarefa realizada na unidade triádica exigida pela estética
da recepção.
Tarefa realizada pelo leitor ideal – um moderno leitor
implícito barthesiano.
DULCINEA
SANTOS é formada em Letras. Faz crítica literária,
coordena grupos de estudo junto ao Traço Freudiano Veredas Lacanianas,
em Recife. É Organizadora e Co-Autora de Rodopiano.
Conheça dela também Mire Veja -o grau zero
da escrita? e ...Ou Pior e Paulo.