Luiz-Olyntho Telles da Silva Psicanalista



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O LEOPARDO
UMA RECOMENDAÇÃO DE LEITURA
Para a revista Sepé, novembro/2023.

Luiz-Olyntho Telles da Silva

A cada vez que recebo uma demanda enfrento-me ao dilema: atendê-la ou não atendê-la, uma dúvida provocada, antes de tudo, pelo questionamento de meus próprios recursos. Para recomendar algum livro, acredito que, com o fim de orientar o leitor que visa sobretudo à literatura contemporânea, por certo, eu precisaria ler uma grande variedade dos que foram recentemente lançados, e eu, por ser leitor vagaroso, não tenho conseguido ler, inclusive, nem todos aqueles clássicos e modernos de que gostaria. Então, dentre os que li, qual critério utilizar para a recomendação?

Freud, respondendo ao pedido de uma relação de bons livros, distinguiu-os primeiramente dos melhores; são antes, diz ele, tais como bons amigos, aqueles aos quais voltamos de quando em quando. Porém, na solicitação de nosso editor, Lucio Carvalho, não há nenhuma especificação desse tipo, aliás, quando o especifica, diz valer qualquer livro, novo ou antigo, desaconselhando apenas, para que não percamos tempo, a menção de maus livros.

Então, tomarei por critério o mesmo de Enrique Vila-Matas, ao escrever o seu Bartleby e Companhia. Ele menciona aí diversos escritores, todos eles tendo como traço comum a produção de apenas um ou dois livros, ou aqueles que, de repente, pararam de escrever, dominados pelo que chamou de pulsão negativa. É isso!

O escritor que recomendarei escreveu, praticamente, um único livro e seu sucesso, depois de enfrentar a negativa de alguns editores, foi mundial. Refiro-me a:

Giuseppe Tomasi di Lampedusa. O Leopardo. Trad. de Rui Cabeçadas. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1961, 2ª edição, 236p.

Um título, aliás, não incluído na relação de Vila-Matas.

Os outros escritos do príncipe de Lampedusa não passam de alguns contos e ensaios sobre a prosa francesa do século XIX, Stendhal, Mérimée, Flaubert... Quanto ao seu Leopardo, contudo, levou vinte e cinco anos para terminá-lo, quase a metade de sua curta vida, e se foi antes de saber que um editor o aceitara. No seu leito de morte ainda insistiu para que se encontrasse um editor e pediu que só não o publicassem às suas expensas, pois isso o deixaria muito humilhado. E devo registrar que, antes desse tempo, esteve prisioneiro, durante a Primeira Guerra Mundial, no campo de Szombathely, na Hungria.

Os livros precisam mesmo encontrar o editor certo, pois quando a versão datilografada caiu nas mãos de Giorgio Bassani, ele não precisou ler mais que uns poucos parágrafos iniciais para ver que se tratava de um texto importante. A leitura completa só o confirmou, e sua primeira edição saiu, na Itália, em 1958.

Conheci-o em 1963, na tradução de Rui Cabeçadas. Depois disso, tivemos ainda outras três traduções: a do nosso conterrâneo José Antonio Pinheiro Machado, para a L&PM, em 1983, a de Leonardo Codignoto, para a Nova Cultural, em 2002, e a de Marina Colassanti, que preferiu manter o título italiano, O gatopardo, para a Bestbolso (Record), em 2007. A crítica tende a elogiar muito a de Pinheiro Machado e a de Colasanti, mas termina por reconhecer que Cabeçadas encontrou soluções muito adequadas para passagens controversas. Recentemente, preparando-me para uma viagem à Sicília, reli-o, e a narrativa voltou a encantar-me.

Agora, com todo o cuidado para não cometer nenhum spoiler, direi apenas que a história se desenvolve aí, nesta América da antiguidade, onde outrora desembarcaram dórios, jônios, fenícios, cartagineses, romanos, bizantinos e islamitas. O destaque é para uma família da mais alta aristocracia da ilha, cujo poder é ameaçado quando aí desembarca Garibaldi, com seus descamisados, prenunciando a transição do regime monárquico, já pressionado pelos novos tempos, prolongando-se o relato até os primórdios do Novecento.

Centrado na figura do príncipe Fabrizio Salina, construído sobre as lembranças de seu bisavô, Giulio Fabrizio, o romance tem como principal coadjuvante Tancredi, um jovem desenhado conforme a figura de seu filho adotivo (um primo distante), Gioacchino Lanza Tomasi, importante por sua ligação com a burguesia ascendente. Sua prosa é lírica e, dotada de um aguçado acento crítico, concede muito pouco ao romântico, tão caro à narrativa do Ottocento. A Sicília que nos descreve é viva, animada por um espírito vigoroso e muito moderno, plenamente consciente dos problemas históricos e políticos contemporâneos. Com o príncipe, astrônomo amador, sempre na companhia do Padre Pirrone, seu confessor, e também do seu cão, Bendicó – que não é de menor importância para a compreensão do texto –, percorremos aqueles confortáveis salões palacianos, ainda que sem luz elétrica, e podemos vê-lo ora ocupado com a administração de sua propriedade, ora preocupado com os conflitos políticos entre o reinado e a república, e também, em seus momentos de fastio, com a histeria e a carolice da esposa, a Princesa Stella, que não se entregava a ele, jamais, sem antes recitar três ave-marias e fazer o sinal-da-cruz.

O romance ganhou uma versão cinematográfica, dirigida por Luchino Visconti, com Burt Lancaster no papel principal, e está hoje traduzido em todas as línguas.


Conheça a

Autores criticados:

- Alba Flesler

- Ana Mariano

- André Maurois

- Berenice Sica Lamas

- Carlos María Domínguez

- Cecília Plá

- Cristovão Tezza

- David Krapf

- Donaldo Schüler

- Enrique Vila-Matas

- Erico Verissimo

- Ernesto Daniel Márquez

- Eurípides

- Fátima Quintas

- Ferenc Molnár

- G. K. Chesterton

- Gérard Haddad

- Günter Weimer

- Hilda Simões Lopes

- Ian McEwan

- James Joyce (I)

- James Joyce (II)

- James Joyce (III)

- James Joyce (IV)

- Juan Carlos Mosca

- Lenir de Miranda

- Leonardo Brasiliense

- Luís Dill

- Luiz Alfredo Garcia-Roza


- Luiz Antonio de Assis Brasil (I)

- Luiz Antonio de Assis Brasil (II)

- Luiz Eduardo Achutti

- Machado de Assis

- Maria Carpi

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- Maria Sette

- Osvaldo Couso

- Osvaldo Delfabro

- Paulo Raymundo Gasparotto

- Raimundo Carrero

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